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Histórias do Pe. Cabada, SJ: a proteção invisível e graciosa dos “Fofinhos”

Leia a narrativa criada e contada por Pe. Cabada, SJ, sobre a encantadora descoberta de uma menina e sua conversa com anjinhos

 

 

Fofinhos

 

Mãe e filha estão na sala, no primeiro andar de uma casa simples, só com esse andar e o térreo. Mari, de Mariana, a filha única do casal, está vendo um desenho animado na televisão. A mãe está sentada perto da sacada, com as janelas fechadas, lendo um livro. O pai, médico, está no hospital, de onde não sai desde que começou a pandemia.

─ Mãe! ─ gritou a menina ─ Minha amiga disse que a avó dela é uma coroa viva.

─ Como é que é? ─ exclamou a mãe, levantando a vista do livro e virando a cabeça para a filha, sem saber se deveria rir ou ficar séria.

─ Coroa viva ─ repetiu a filha ─ a avó dela é coroa viva!

─ Não é isso, minha filha! É coronavírus! Corona… vírus…

─ Minha amiguinha disse coroa, coroa viva!

─ Sua amiguinha deve ter entendido errado. Ela confundiu coronavírus com coroa viva.

─ Isso é bom?

─ O coronavírus? Não é bom. É muito ruim!

─ Mãe! Se é ruim, por que a avó dela tem? Ela é muito boazinha. Como minha avó! Todas

as avós têm que ter isso? Os avós também?

A mãe deixou o livro sobre a poltrona onde estava sentada e foi sentar-se ao lado da filha. Olhou para a tela da televisão. Uma menina corria atrás de uma borboleta com uma rede… A borboleta deu um drible na menina e fugiu… Depois, voltou e pousou sobre a cabeça da menina sem que ela percebesse.

─ Você viu como é esperta essa borboleta? ─ comentou a mãe.

Mari riu:

─ Ela enganou a menina!

─ Enganou mesmo e, depois, voltou e pousou na cabeça dela sem que ela percebesse.

─ Porque a borboleta gosta dela e ela gosta da borboleta.

─ E se fosse um marimbondo, ela gostaria?

─ Credo, mãe! É claro que não.

─ Pois é! Coronavírus é como um marimbondo invisível que corre atrás da gente para picar-nos.

─ É por isso que não podemos sair de casa?

─ Exatamente! O pior é que não há apenas um marimbondo. As ruas e a cidade estão cheias de marimbondos famintos e invisíveis.

─ Não podemos pegá-los com uma rede como a de pegar borboletas?

─ Podemos, sim! A rede para pegar esses marimbondos invisíveis, que são os coronavírus, chama-se máscara.

─ Eu já vi gente usando essas máscaras. Mas, se esses marimbondos invisíveis forem picar nas mãos ou no pescoço, não adiantam as máscaras, adiantam, mãe?

─ Adiantam sim, minha filha! É que os coronavírus são muito pequeninos e gostam de picar-nos nos pulmões, no coração e noutras partes dentro do corpo. E o melhor lugar para entrar dentro de nós é pela boca e pelo nariz. Por isso as máscaras escondem a boca e o nariz para que o coronavírus não encontre por onde entrar.

─ Eu vou contar à minha amiguinha.

─ Amanhã você conta, né, minha filha. Agora já é muito tarde e ela deve estar dormindo. E você também vai dormir, tá? E eu também!

A mãe desligou a televisão, deixou o livro dormindo na poltrona e, abraçada à filha, as duas foram dormir nas suas camas…

***

Mari, de Mariana, saiu de casa sem fazer barulho. Ela morava sozinha com sua mãe. O pai dormia no hospital onde trabalhava. Sua casa estava situada no bairro Cidade Jardim. E sua amiguinha morava na segunda casa depois da sua.

Caminhar pelas calçadas das ruas desse bairro era como caminhar ao lado de um jardim. Todas as casas eram de um só andar, separadas da calçada por um jardim que consistia em um gramado bem cuidado, com algumas plantas e arbustos, além de algumas roseiras floridas. Nada demais, mas o suficiente para não se sentir longe da natureza.

Mari caminhava ao lado do jardim, acariciando as folhas com suas mãos ou talvez fossem as folhas que acariciavam as mãos dela. De repente uma borboleta, pousada sobre uma flor, abanou suas asas e este movimento atraiu o olhar da menina. Parou. Era uma borboleta linda, especialmente quando abria suas asas e aparecia o azul brilhante que ficava escondido quando as fechava.

Lembrou-se das palavras de sua mãe e olhou em volta, mas não viu nenhum marimbondo. Ou estaria invisível? Como gostaria de ver as coisas invisíveis! Nesse mesmo instante, alguém ou alguma coisa bateu levemente no seu ombro direito.

Virou-se rapidamente, mas não viu ninguém. Olhou para a direita e para a esquerda, olhou para baixo e para o alto, olhou para longe… Nada!

Quando Mari se voltou para continuar caminhando, viu, a poucos metros de distância, a uma altura um pouco maior do que a sua, algo como uma nuvem ou enxame de pequenos insetos, abanando suas asinhas que brilhavam com o Sol.

Parou e ficou olhando, meio medrosa e meio curiosa. De repente aquela misteriosa nuvem agitou-se e, em poucos segundos, formou uma palavra: VENHA. Mari ficou indecisa e já ia dar a volta e fugir quando a nuvem se agitou novamente e desfez a palavra. Mari esperou mais um pouco, com a curiosidade derrotando o medo. Poucos segundos depois, aquela nuvem viva formou de novo a palavra VENHA.

Então, Mari esqueceu a casa de sua amiguinha e foi… Foi olhando para a nuvem viva com a palavra VENHA. Detrás da nuvem, o céu era azul, como as asas da borboleta.

O que Mari não percebeu foi o momento em que seus pés deixaram de pisar na calçada e começaram a caminhar pelo céu azul. Diante dela apareceu uma bela nuvenzinha branca. A nuvem viva agitou-se mais uma vez: apagou VENHA e escreveu: SENTE-SE.

Mari sentou-se na nuvem branca e quase se afundou nela. Ela apalpou-a com as mãos e sorriu ao sentir a sua gostosa maciez. A nuvem viva agitou-se e apagou SENTE-SE. O que aconteceu a seguir quase fez Mari pular daquela nuvem branca e macia. A nuvem viva aumentou de tamanho e o que ela pensou que fossem insetos, também ficaram do tamanho da borboleta azul… E Mari ficou rodeada de anjinhos sorridentes do tamanho da borboleta azul, todos batendo suavemente suas asinhas.

Mari, admirada, abriu a boca e esqueceu-a aberta durante muito tempo, olhando para um lado e para outro daquela multidão de minianjinhos. Quando, finalmente, lembrou-se de fechá-la, foi para exclamar:

─ Que fofinhos!!!

Uma gargalhada angelical respondeu ao seu comentário.

─ Vocês são mesmo anjinhos? ─ perguntou Mari, depois que todos pararam de rir e se aproximaram dela.

─ Somos anjinhos, todos muito fofinhos! ─ riu um dos anjinhos, beijando-a no rosto.

─ Eu pensei que os anjos eram maiores.

─ Nós somos de todos os tamanhos. Pequeninos como mosquitos e grandes como montanhas!

A única coisa que Mari soube responder foi:

─ Noooossa!

─ Normalmente ─ continuou outro fofinho ─ somos invisíveis.

─ O que é que vocês fazem?

─ Muitas coisas. Agora pertencemos ao batalhão de fofinhos anticoronavírus!

─ Meu pai também!

─ Também é fofinho?

─ Não! ─ riu Mari. ─ Meu pai é médico!

─ Então, é fofinho. E os pais e as mães também são fofinhos.

─ E as avós e os avôs?

─ Superfofinhos! ─ acrescentou outro anjinho, sorrindo, no seu ouvido.

Houve um pequeno rebuliço entre os fofinhos. A menina olhou-os, preocupada:

─ Já vão embora?

─ Sim! Precisamos cuidar de todos os habitantes da terra.

─ E como cuidam de nós?

Os fofinhos sorriram antes de responder.

─ Nós nos ocultamos detrás das máscaras que as pessoas usam nas ruas, nas praças, nos supermercados, nos hospitais, nos asilos e nos outros lugares onde houver gente. Sempre de prontidão para ajudar e atender os pedidos de quem precisar, oferecendo a nossa colaboração para que, bem unidos, céu e terra, saiamos vitoriosos nesta luta.

Mari escutou o fofinho com muita atenção. Depois perguntou:

─ As pessoas não os veem quando entram debaixo das máscaras?

─ Não, porque ficamos invisíveis.

─ Eu também posso ser anjinha? ─ pediu animada Mari.

─ Você já é fofinha. Então, já é meio anjinha ─ riram os anjos fofinhos…

─ O que devo fazer?

─ Para começar, grite: “fique em casa!”

O rebuliço voltou e os fofinhos tornaram-se invisíveis… Mari gritou:

─ TCHAU, FOFINHOS!!!

─ Fique em casa!!! – responderam.

Nesse mesmo instante, alguém ou alguma coisa bateu levemente no seu ombro direito. Mari virou-se rapidamente e uma voz suave penetrou nos seus ouvidos:

─ Acorda, dorminhoca!!!

─ A corda? Que corda? ─ Mari abriu os olhos, espantada, e viu sua mãe.

─ Oi, mãe!!!

A menina olhou em volta. Estava no seu quarto, na sua cama, a cabeça no seu travesseiro…

─ Como cheguei aqui?

─ Andando… Uai! Ontem à noite, comigo…

─ Quer dizer que… foi um sonho…

E começou a chorar.

─ Por que está chorando, minha filha?

─ Não estou chorando! Foram uns fofinhos que entraram nos meus olhos!

─ Como é que é???

 

Pe. Cabada, SJ