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Histórias do Pe. Cabada, SJ: os encontros e desencontros da vida em “Um dia, elas saberão”

Leia a narrativa criada e contada por Pe. Cabada, SJ, sobre uma dupla que muito se desencontra até se tornar um casal

 

 

Um dia, elas saberão

 

Era uma vez…

Uma namorada que não tinha namorado.

E um namorado que não tinha namorada.

 

Caminhando por uma trilha que beirava o parque, a namorada, que não tinha namorado, viu o

namorado, que não tinha namorada. E o namorado, que não tinha namorada, o qual caminhava pela mesma trilha, no lado oposto do parque, viu a namorada, que não tinha namorado. Mas nenhum dos dois se importou com essa visão.

 

Por causa disso, a namorada, que não tinha namorado, quase bateu de cara com o namorado, que não tinha namorada, quando as duas trilhas se uniram, mostrando que eram uma só trilha. Os dois se assustaram com o encontro inesperado.

 

Exatamente naquele lugar, onde quase aconteceu a trombada da namorada, que não tinha

namorado, contra o namorado, que não tinha namorada, havia um lindo banco. Os dois, sem combinarem nada, sentaram-se nele.

E lá ficaram ambos, em silêncio, sem olhar um para o outro. Perdendo tempo. Imóveis como duas estátuas pensantes.

É isso mesmo: pensantes. Porque a única coisa que faziam era pensar.

Por coincidência, os dois pensavam a mesma coisa…

 

Ela: “Que é que estou fazendo aqui, à toa, em vez de continuar procurando um namorado?”

Ele: “Que é que estou fazendo aqui, à toa, em vez de continuar procurando uma namorada?”

 

E, como os dois pensavam a mesma coisa, também acabaram de pensar ao mesmo tempo,

levantaram-se ao mesmo tempo e continuaram a caminhada interrompida, pelo mesmo parque, ao mesmo tempo, ela numa direção e ele noutra, mas pela mesma trilha…

Ela à procura de um namorado, e ele à procura de uma namorada.

 

Como a trilha dava a volta completa no parque, a namorada, que procurava um namorado, e o

namorado, que procurava uma namorada, caminhando na mesma velocidade, iriam cruzar-se na metade da caminhada e se encontrariam, completando a volta, no mesmo banco. Eles sabiam disso, porque eram bons em matemática.

 

Mas também eram bons nas regras de trânsito, e, como caminhavam pela mesma trilha, em sentido contrário, para evitar uma trombada inesperada, a namorada, que procurava um namorado, caminhava pelo lado direito dela, e o namorado, que procurava uma namorada, caminhava pelo lado direito dele.

 

Como se esforçaram em seguir fielmente as regras de trânsito, não se viram, nem quando se

cruzaram na metade do trajeto, nem quando passaram ao lado do banco, que continuava, como antes, parado no encostamento da trilha, oferecendo-lhes seu assento.

Quando já estavam longe do banco, os dois tiveram o mesmo pensamento.

Ela: “Cadê o banco? Pensei que ficava mais perto! Vou ficar atenta! Quero sentar-me um pouco…”

Ele: “Cadê o banco? Pensei que ficava mais perto! Vou ficar atento! Quero sentar-me um pouco…”

 

Por causa disso, a namorada, que procurava um namorado, e o namorado, que procurava uma

namorada, procuravam agora, também, um banco, onde relaxar seus corpos cansados.

Ignorando as regras de trânsito, fixaram seus olhares nas beiradas da trilha para não deixar, mais uma vez, o banco passar.

 

O banco chegou para os dois, ao mesmo tempo, e a namorada e o namorado, que procuravam

um namorado e uma namorada, não o deixaram passar. Sentaram-se nele, depressa, cada um numa ponta, sem se verem, pois, mesmo sentados, continuavam olhando em volta, sem perceber que tinha mais alguém sentado no banco. Quando, de repente, os dois se viraram e seus olhares se cruzaram, quase escorregaram do banco, com o susto.

 

Os dois reagiram, ao mesmo tempo, e, aliviados, sorriram um para o outro, também, ao mesmo tempo. Depois de um tempo sorrindo, sem saber como desligar o sorriso, riram mais ainda, porque descobriram que ainda não tinham aprendido a desligar o sorriso.

 

Foi a namorada, que procurava um namorado, quem primeiro desligou o sorriso, exclamando:

— Eu creio que já vi você em algum lugar!

O namorado, que procurava uma namorada, como se acordasse naquele instante, respondeu:

— Estava pensando a mesma coisa!

 

Aí, os dois se olharam intensamente, como procurando alguma lembrança no fundo de suas

memórias. De repente…

 

Ela:

— Eu acho…

Ele:

— … Que foi…

Ela:

— … Neste banco!

 

E riram, um de cada vez, para não se atrapalharem…

 

Quando cada um riu o tempo que lhe correspondia, a namorada, que procurava um namorado,

perguntou ao namorado, que procurava uma namorada:

— Que está fazendo neste parque?

— Procurando uma namorada! — respondeu Ele.

— Que coincidência! Eu também! — disse Ela.

— Procurando uma namorada?! — estranhou Ele.

— Não! Um namorado! — explicou Ela.

— Nesse caso, eu posso ajudá-la. — ofereceu Ele.

— A procurar um namorado? — perguntou Ela.

— Certo! — confirmou Ele.

— Aceito! E eu posso ajudar você! — ofereceu Ela também.

— A procurar uma namorada? Então, vamos! — animou-se Ele.

— Vamos! — decidiu Ela.

 

A namorada, que procurava um namorado, e o namorado, que procurava uma namorada,

levantaram-se rapidamente e iniciaram uma nova caminhada pela trilha, agora, os dois juntos, na mesma trilha e na mesma direção, Ela olhando para a direita e Ele para a esquerda, sem se preocuparem com as regras de trânsito, nem com a matemática… Ela procurando uma namorada para Ele, e Ele um namorado para Ela.

 

Deram a volta completa sem encontrar um namorado para Ela e uma namorada para Ele. Sentaram-se no mesmo banco. Ela triste por não ter encontrado uma namorada para Ele, e Ele triste por não ter encontrado um namorado para Ela. E ficaram naquele banco muito tempo, quase até a noite…

 

***

 

Passaram-se muitos anos. Tão rápidos que pareceram poucos.

Era noite. A família toda estava vendo televisão quando Arita, a filha mais nova, dedurou a irmã mais velha, Marita, de apenas 14 anos, cantarolando:

— Marita está namorando!

 

Os pais se viraram para Marita. “Ela” foi a primeira a falar:

— Verdade?

— Sim, mãe. Nós nos conhecemos no parque.

— No parque? — exclamaram ao mesmo tempo, “Ela” e “Ele”, abraçando-se e rindo às gargalhadas.

 

As duas filhas não sabiam por que os pais se abraçaram e estavam rindo desse jeito…

Mas, um dia, elas saberão…

 

Pe. G. Cabada, SJ