Os usos políticos do passado e os porquês de estudar História

 

A História não está pronta, ela não é fixa, pois não existe uma verdade absoluta, uma vez que sofre uma reescrita constante. A História é uma disciplina que procura responder às principais perguntas do presente e, nessa conjuntura, são extremamente relevantes os diversos olhares para o passado que abrem os espaços de lutas de memória. É nesse sentido que, para o nosso início de conversa, destaco um ponto de partida essencial de que o passado é tão misterioso quanto o futuro. As narrativas construídas dependem das apropriações que foram feitas e dos interesses dos sujeitos históricos em seus diversos tempos e espaços. Percorreremos aqui o caminho de alertar a todos e todas sobre os usos políticos do passado para depois mergulharmos mais fortemente sobre os motivos essenciais de estudarmos História.

 

 

Os usos políticos do passado devem ser avaliados, porque não existe neutralidade científica, já que os atores sociais interpretam o passado de acordo com os seus propósitos. É preciso ter esse cuidado ao revisitar as memórias, que, na maior parte das vezes, são marcadas por lembranças e esquecimentos. Nessa linha de raciocínio, costuma-se exaltar aquilo que é mais conveniente no jogo de interesses e apaga-se o que se elegeu que não deve ser lembrado.

 

 

Uma das formas de aprofundarmos o conhecimento histórico é a interdisciplinaridade. Estudar História tem mais sentido quando o conhecimento é interconectado, formando uma teia de possibilidades de relações entre os elementos pesquisados. Como dissera Marc Bloch, é essencial estudar a história dos homens no tempo, e não apenas de fatos estanques e impermeáveis. Nesse aspecto, é importante lembrar como se relaciona a história ao homem e ao tempo e como visualizam os seus ídolos, e o que se entende por passado e presente. A partir daí, poderemos perceber melhor as apropriações políticas do passado.

 

 

Uma maneira interessante de estudar História consiste em legitimar vozes que não foram ouvidas. É reconhecer que a História também é vista de baixo, porque ajuda a convencer aqueles de nós nascidos, sem colheres de prata, de que viemos de algum lugar. É justamente nesses lugares onde as identidades foram escondidas que poderemos escavar a busca de outras narrativas que ainda não conhecemos, inclusive de pessoas comuns, que quase sempre foram relegadas pela História dita oficial e supostamente portadora da verdade.

 

 

Portanto, mergulhando mais profundamente na pergunta essencial aqui “Por que estudar História?”, reitero a importância de não só olhar, porém reparar com detalhes a realidade, decodificar os problemas que o mundo nos mostra e apresentar alternativas, que não proclamem o fim da História, mas uma eterna possibilidade de criação e reconstrução de trilhas, as quais possam levar os homens a vislumbrarem formas de admirarem os diversos projetos de vida.

 

 

Estudar História é se debruçar sobre as questões de cidadania e inclusão social, é pensar na alteridade e empatia para a construção de um mundo melhor. Nesse sentido, torna-se evidente, na contemporaneidade, a importância da História para garantir a permanência de conquistas sociais como democracia, direitos humanos e respeito às minorias. A História nos possibilita compreender melhor o papel do homem enquanto animal político, um ser dotado de inclinações culturais e sociais, que ultrapassam o individualismo.

 

 

De forma geral, a História nos faz construir o conhecimento e produzir ações de cidadania capazes de transformar as vidas humanas nos seus reconhecimentos de estórias, legitimidade de narrativas e de lugares de fala dando vozes àqueles que foram pouco escutados ao longo do tempo, reescrevendo trajetos e possibilidades novas.

 

Bibliografia:

BURKE, Peter. A escrita da História, novas perspectivas. São Paulo. Editora da Universidade Estadual Paulista, 1992.

 

 

______. A Escola dos Annales: 1929-1989. A Revolução Francesa da historiografia. São Paulo: Editora Unesp, 1997.

 

 

WHITE, Hayden. O fardo da história. In:_. Trópicos do discurso: ensaios sobre a crítica da cultura. São Paulo: Edusp, 1994.

 

 

https://www.cafehistoria.com.br/o-que-sao-usos-politicos-do-passado/.

 

Por Leandro de Almeida Silva
Professor

Estudante do Colégio dos Jesuítas chega à final de competição nacional com projeto de app para tratamento de paralisia facial

 

A estudante Mirella Diniz Wunderlich, da 3ª série do Ensino Médio, está na fase decisiva da Olimpíada do Futuro – Sapientia, que acontecerá em Foz do Iguaçu, no Paraná, nos dias 2 e 3 de dezembro. Para a competição, Mirella e sua equipe criaram a proposta do aplicativo Sorria!, destinado ao tratamento de pessoas com paralisia facial. Os projetos apresentados no certame precisam ter um impacto social, com foco em melhorar a vida em comunidade.

 

Outras oito equipes brasileiras e uma equipe paraguaia também participam da Olimpíada. Segundo a organização, o júri é formado por especialistas do mercado financeiro, educadores, empresários, designers e jornalistas. Os outros quatro membros da equipe de Mirella são residentes em Belo Horizonte, Fortaleza, São Paulo e São José dos Campos (SP).

 

Segundo a jovem, a proposta tem relação com sua experiência familiar. Tanto a mãe quanto o pai de Mirella tiveram episódios de paralisia facial após passarem por cirurgias de retirada das glândulas salivares, em 2012 e em 2017, respectivamente. A possibilidade de elaborar uma iniciativa em prol das pessoas com paralisia facial surgiu quando a estudante, junto com os outros integrantes do grupo, recebeu o convite para participar da Sapientia após os bons resultados alcançados na Olimpíada Brasileira de Economia (OBECON), em que Mirella foi medalhista de prata.

 

“Essa ideia surgiu como uma possibilidade de aliar o nosso conhecimento sobre criação de negócios e finanças, que surgiu na OBECON, com a iniciativa social, que é da Sapientia. Eu conversei com as pessoas do grupo sobre essa experiência pessoal minha e dei a ideia de o aplicativo usar a inteligência artificial como mediadora para esse tratamento”, conta a jovem, que ocupa o cargo de Chief Tecnology Officer (CTO) do grupo, ou seja, é a diretora técnica da equipe.

 

Pela proposta do app Sorria!, o paciente poderá fazer exercícios direcionados a cada estágio e tipo de paralisia, acompanhado por vídeos instrutivos com profissionais especializados, como os fisioterapeutas faciais. O algoritmo de inteligência artificial será responsável por corrigir os movimentos feitos pelos usuários, por meio do reconhecimento facial. Cada paciente terá um cronograma personalizado. O app também terá um sistema de recompensa para estimular a continuidade e a frequência diária de exercícios.

 

De acordo com a estudante Mirella Wunderlich, um dos pilares do projeto é o acesso democrático ao aplicativo. “A gente tem como meta o acesso a baixo custo, dessa forma, todo o acesso primário ao aplicativo será gratuito. Como forma de monetização, contamos, principalmente, com propagandas e compras dentro do app. Então o usuário poderá ter, por exemplo, um upgrade dentro do aplicativo, de acordo com sua vontade. Mas o uso primário é completamente gratuito”, conta a estudante, que também prevê parcerias com hospitais, seguros e planos de saúde, com o objetivo de levar o serviço a mais pacientes e gerar viabilidade financeira para a empreitada.

 

Mirella mostra o app ao lado de parte da equipe criadora.

 

Série de resultados positivos 

Chegar à fase final das Olimpíadas do Futuro – Sapientia é mais uma conquista na trajetória acadêmica da estudante Mirella Wunderlich. Ela já recebeu a medalha de prata e o título de “Menina Olímpica” na Olimpíada Brasileira de Economia (OBECON). Mirella também já foi 1º lugar na América Latina na Tiger Global Case Competition (TGCC), certame de empreendedorismo internacional on-line entre jovens de 13 a 18 anos, e teve o Melhor Business Case da IEO Open Track, uma versão da Olimpíada Internacional de Economia.

 

“A sensação de chegar em mais uma final, é incrível, quase inacreditável. É realmente fruto de muito esforço e dedicação não só minha, mas do time como um todo, da comissão organizadora das Olimpíadas. Encerrando agora o Ensino Médio, eu acho que é uma forma fantástica de fechar com chave de ouro”, avalia.

 

Para Mirella, a formação acadêmica e humanística proporcionada pelo Colégio dos Jesuítas, teve relevância no resultado conquistado até agora. “O Colégio, com sua educação social, educação para os outros, toda a questão do Magis, influencia muito nessa decisão de participar de projetos e desenvolver iniciativas que tenham esse impacto social”, acredita a estudante.

 

​Confira o site do aplicativo Sorria! e o vídeo oficial de apresentação.

 

Confira algumas do app em nossa galeria:

 

O Dia da Consciência Negra

 

No sábado foi celebrado o Dia da Consciência Negra. O 20 de novembro foi a data escolhida por ser o dia em que Zumbi, último líder do Quilombo dos Palmares, foi assassinado no ano de 1695.

 

Convido você a fazer uma viagem pelo tempo. Brasil, século XVII. A escravidão de africanos e afrodescendentes era permitida pelos governantes. Neste contexto, os quilombos eram lugares de refúgio para os escravizados. O mais importante de todos ficava na região da Serra da Barriga, na então capitania de Pernambuco. Era o Quilombo dos Palmares, área hoje pertencente ao município de União dos Palmares, no estado de Alagoas.

 

O Quilombo dos Palmares conseguiu se contrapor por, aproximadamente, um século, às investidas de colonizadores europeus e seus representantes, tornando-se um símbolo da resistência dos escravizados. Um dos líderes de Palmares foi Zumbi, que era brasileiro e nasceu liberto, mas foi escravizado na infância e conseguiu fugir na juventude.

 

Assim, as figuras de Zumbi e do Quilombo dos Palmares foram resgatadas por integrantes do movimento negro. A ideia da celebração no dia 20 de novembro foi impulsionada por um grupo de jovens negros que se reuniam em Porto Alegre na década de 1970.

 

A data entrou para o currículo escolar no ano de 2003. Em 2011 foi criado oficialmente o Dia de Zumbi e da Consciência Negra, instituído pela Lei Nº 12.519, de 10 de novembro de 2011.

 

Atualmente, o Dia da Consciência Negra é feriado em cinco estados e mais de mil municípios. Um projeto de lei aprovado no Senado Federal em agosto de 2021 (PLS 482/2017) determina a criação do feriado nacional do Dia de Zumbi e da Consciência Negra. A proposta ainda precisa passar por votação no plenário da Câmara dos Deputados.

 

Esta é uma data que deve ser celebrada e, também, servir como um momento de reflexão para a luta antirracista. A escravidão foi abolida em 1888, mas, ainda hoje, o país e a população negra sofrem com os efeitos de séculos de problemas na estrutura da sociedade.

 

Estudo do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) divulgado em 2019, aponta que pretos ou pardos representavam 64,2% da população desocupada no Brasil. Os números também apontam a falta de igualdade na representação política: apenas 27,3% das pessoas eleitas para os cargos de deputados distritais, estaduais, federais e senador eram negras. No mesmo ano, a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílio Contínua (Pnad Contínua) mostrou que a população negra correspondia a 56% do total de brasileiros.

 

Existem outras situações em que esses problemas estruturais se mostram presentes. Por isso, a importância de uma data como o Dia da Consciência Negra, para podermos discutir o papel do negro na sociedade e lutarmos contra a desigualdade e o preconceito.

 

Referências:

https://www12.senado.leg.br/noticias/infomaterias/2021/11/dia-da-consciencia-negra-50-anos-liberdade-conquistada-nao-concedida

 

https://www12.senado.leg.br/noticias/materias/2021/08/23/aprovado-feriado-nacional-pelo-dia-de-zumbi-e-da-consciencia-negra

 

https://www1.folha.uol.com.br/fol/brasil500/zumbi_19.htm

 

https://www1.folha.uol.com.br/fol/brasil500/zumbi_1.htm

 

Por Igor Santos

Assistente de Comunicação

A Proclamação da República no Brasil

 

No ano de 1889, no dia 15 de novembro, aconteceu no Brasil um movimento político que culminou na derrubada da monarquia e, consequentemente, na Proclamação da República. Mais do que apenas um processo transitório, esse episódio mudou os rumos do Brasil, principalmente na política. Dom Pedro II deixou de ser imperador, e foi montado um governo de transição com características republicanas, embora conduzido por militares. O marechal Deodoro da Fonseca foi posto como presidente até que eleições fossem organizadas.

 

O Brasil no século XIX vinha enfrentando sérios problemas políticos e econômicos que resultaram no enfraquecimento da Monarquia, levando-a a uma crise. Os elementos essenciais que possibilitaram a adoção do modelo de governo republicano no Brasil foram: a crise no sistema escravista, destacando os movimentos abolicionistas e a pressão estrangeira que culminaram na Lei Áurea, a crise de produção agrícola, devido ao modelo latifundiário, a influência da maçonaria e os conflitos com a Igreja Católica principalmente no fato do Beneplácito e o militarismo que se consolidou após a Guerra do Paraguai, passando a ter um Exército organizado que requeria direitos e soldos.

 

O desgaste do Império brasileiro era visível. Nenhum dos setores políticos da sociedade apoiava mais o imperador Dom Pedro II. Com a fundação do Partido Republicano, em 1870, a luta republicana ganhou mais força, juntando-se à luta abolicionista. A união desses movimentos acabou sendo o maior fator para o desgaste do governo imperial.

 

Embora mais aberta politicamente do que o Império, a República no Brasil foi organizada por pensadores e intelectuais ligados às classes mais ricas, tanto urbanas quanto rurais e, portanto, interessadas em manter suas vantagens e regalias. Desse modo, a República instaurada no Brasil não era democrática porque, mais uma vez, o povo observou de longe os acontecimentos e não teve o direito de participar diretamente do processo.

 

Por Adriana Malaquias

Professora

Somos criaturas leitoras

 

Com frequência, ouvimos falar – e também falamos – sobre a importância da leitura em nossas vidas, sobre a necessidade de se cultivar o hábito de ler desde a infância, sobre o papel da escola na formação de leitores competentes. É nessa infinidade de representações e funções da leitura que Alberto Manguel, escritor argentino e leitor voraz, afirma: “Somos criaturas leitoras, ingerimos palavras, somos feitos de palavras, sabemos que palavras são nosso meio de estar no mundo, e é através das palavras que identificamos nossa realidade e por meio de palavras somos, nós mesmos, identificados.”

 

Manguel fala da leitura como um mecanismo que nos permite olhar para dentro de nós, como fonte de autoconhecimento e construção de nossa identidade. Traz à tona o caráter humanizador intrínseco à literatura. Diante dela, o homem repensa seu papel no mundo, seus valores e princípios.

 

E, de fato, o que isso quer dizer? Encontramos resposta a essa pergunta nas palavras do grande mestre Antonio Candido e nas lições que ele nos deixou em seu clássico artigo “O direito à literatura”, de 1988:

 

“[…] assim como não é possível haver equilíbrio psíquico sem o sonho durante o sono, talvez não haja equilíbrio social sem a literatura. Deste modo, ela é fator indispensável de humanização e, sendo assim, confirma o homem na sua humanidade, inclusive porque atua em grande parte no subconsciente e no inconsciente.”

 

Nessa afirmação, Candido nos dá uma dimensão da importância da literatura em nossas vidas. Diante do texto literário, o leitor tem a oportunidade de reconhecer a si mesmo e o mundo que o cerca. Abre-se uma vasta gama de possibilidades de viver situações que talvez não imaginasse, de estar em lugares que talvez nunca visitasse, de pensar como pessoas que jamais conhecesse.

 

Porque nos faz imaginar, a literatura traz consigo a aptidão de criar uma civilização capaz de sonhar. Ela nos permite criar situações não só para que possamos vivenciar novas experiências, mas para que possamos criar mundos diferentes. E assim, na contraface da imaginação, o olhar sobre a realidade ganha viés crítico. Quando somos capazes de idealizar, de pensar em novas maneiras de viver, de sonhar um mundo melhor, somos também capazes de pensar e de buscar uma sociedade mais justa. É como diria Mario Quintana: “Livros não mudam o mundo, quem muda o mundo são as pessoas. Os livros só mudam as pessoas.”

 

Afastar-se da literatura ou privar-se dela pode gerar um estado “anestesiado”, de indiferença ao que se passa fora dos muros da própria existência e, sobretudo, ao sofrimento alheio. A escritora e formadora de professores e mediadores de leitura, a argentina Maria Teresa Andruetto (2018), alerta sobre esse perigo da “indiferença”. Em suas palavras:

 

Se a literatura nos permite entrar no coração do outro, então, evitá-la nos ajuda a viver anestesiados. A anestesia na leitura se constrói por um caminho de formas fixas, estereótipos que impedem penetrar a superfície dos textos e da vida. (…). Histórias narradas em uma linguagem amável e inócua em oposição ao literário, cuja potência reside na possibilidade de nos inquietar, de nos conduzir às zonas inesperadas de nós mesmos.

 

Assim, a literatura é, ao mesmo tempo, o lugar em que nós nos formamos como seres humanos e arcabouço de conhecimento das sociedades todas. É instrumento de reflexão, de compreensão de nós, do outro e do mundo e, como tal, relaciona-se diretamente com os princípios inacianos.

 

Por fim, retomo as palavras de Carlos Drummond de Andrade, poeta mineiro de alma e ofício, em seus versos: “Tudo que sei é ela que me ensina./ O que saberei, o que não saberei nunca, está na Biblioteca em verde murmúrio/ de flauta-percalina eternamente”. A leitura não está presente apenas no texto, está dentro de cada leitor que confere a ele um significado único. Portanto, hoje, no Dia Nacional do Livro, venho homenagear não apenas os escritores, mas também os leitores. Desejo a todos ótimas leituras e um feliz Dia Nacional do Livro!

 

Por Patrícia Miranda Machado

Assessora de Área – Linguagens

Nossa Senhora Aparecida: A Santa do Brasil

 

A devoção a Nossa Senhora Aparecida teve início no ano de 1717 quando pescadores encontraram no Rio Paraíba uma velha e escurecida imagem de Nossa Senhora da Conceição.

 

São escassos os documentos que registram o encontro da imagem. Oito anos após aquele acontecimento, o pároco de Guaratinguetá redigiu um relatório sobre ele, nomeando os três pescadores, Domingos, João e Filipe, responsáveis em encontrar a imagem. Esse texto serviu de base para o que foi escrito no Livro Tombo da paróquia, em agosto de 1757, pelo vigário Padre João de Morais e Aguiar, sob o título “Notícia da Aparição da Imagem da Senhora”.

 

No Livro Tombo da Paróquia de Santo Antônio de Guaratinguetá, conservado no Arquivo da Cúria de Aparecida, encontra-se a narrativa feita pelo vigário. Ela registra que foi “achada” a imagem pelos três humildes pescadores: “João Alves, lançando a rede de arrasto, tirou o corpo da Senhora sem cabeça; e lançando mais abaixo outra vez a rede, tirou a cabeça da mesma Senhora, não se sabendo nunca quem ali a lançasse”.

 

A imagem ficou sob a guarda do pescador Filipe Pedroso por 15 anos. Foi construído um pequeno altar onde as famílias vizinhas se reuniam para rezar o terço e outras orações. A partir daí, teve início a devoção que depois se tornaria o maior movimento religioso do país. Atualmente a imagem se encontra no Santuário Nacional de Aparecida, sendo o principal centro de peregrinação da Igreja Católica no Brasil.

 

Essa breve narrativa dos fatos que envolvem a aparição da imagem para os pescadores marca consideravelmente a história da devoção dos brasileiros à mãe de Jesus. Trata-se de uma expressão popular de afeto que traz à tona a reflexão sobre o papel materno e espiritual de Nossa Senhora Aparecida na consolidação da identidade cristã dos fiéis católicos. Diz de como, por meio da fé devocional, o povo de Deus tende a saltar para o comprometimento com a Boa Nova do Evangelho. Tal como relata o evangelista João 2, 5: “fazei tudo o que Ele vos disser”, Maria de Nazaré foi aquela que nos ensinou a colocar em prática os ensinamentos do Senhor, e isso ainda hoje é reconhecido e valorizado.

 

Muitas vezes, diante das dificuldades cotidianas, o amparo de Nossa Senhora, com seu exemplo de disponibilidade ao projeto de Deus e intercessão constantes, é alento que anima e fortalece a caminhada de fé dos cristãos. Ontem, hoje e sempre, a entrega sem reservas da Mãe de Jesus, demonstrada em palavras e atitudes de amor ao próximo, colabora para a construção de uma sociedade melhor. Nesse sentido, o cultivo da devoção mariana é muito mais que mera expressão da religiosidade popular nacional, pois, quando se inspiram no testemunho de Maria de Nazaré, as pessoas refletem a mensagem de que relações mais humanas e fraternas são possíveis em nosso país.

 

Essa perspectiva histórica e mariológica, portanto, reafirma que o 12 de outubro é um dia mais que especial. Por oportunizar justas orações e homenagens à padroeira do Brasil, a data nos recorda que podemos continuar contando com a proteção daquela que cumpriu os desígnios de Deus e, por isso, podemos também seguir trilhando o caminho do amor e do serviço ao outro. Isto sim é motivo de esperança porque, segundo cremos, a Mãe do Céu Morena mantém um olhar atento e cuidadoso sobre a vida do povo brasileiro.

 

Por Marcelo Sabino

Coordenador da Formação Cristã

 

Adriana Malaquias 

Professora 

A voz do povo é a voz de Deus: breve reflexão sobre o folclore brasileiro

 

Tradicionalmente, entende-se que o termo folclore seja um neologismo de folk-lore, no qual o vocábulo inglês folk significa “gente” ou “povo” e lore significa “conhecimento”. Assim, pode ser entendido como um conhecimento tradicional de um povo. Sua primeira utilização remete-se ao século XIX, quando Ambrose Merton (pseudônimo do arqueólogo Willian Thoms) teria enviado uma carta à revista londrina “The Atheneum”, que a publicou em agosto de 1845 usando o termo.

 

Porém, o interesse pelo folclore nasce muito antes, no fim do século XVIII, quando autores como os Irmãos Grimm e Herder iniciaram estudos acerca da poesia tradicional alemã. Através desses estudos, foi desvelada uma cultura popular que, rapidamente, passou a ser colocada em oposição à cultura das elites e das instituições oficiais, considerada erudita.

 

Da Alemanha, esse interesse despertou a curiosidade de estudiosos de outros países e se espalhou em círculos de estudos de outras formas culturais, como as músicas, as práticas religiosas etc. No início da organização sistemática desses saberes populares, os estudiosos adotaram métodos aplicados ao estudo da cultura erudita, fato que inviabilizava compreensões mais profundas dos modos de ver o mundo encarnadas naquelas narrativas campesinas.

 

Assim, o resultado desses primeiros estudos reforçou a dicotomia erudito x popular, produzindo, consequentemente, uma ideia de hierarquia na qual o erudito se tornou melhor do que o popular. A palavra folclore passou a ser utilizada para se referir às tradições, aos costumes e às superstições das classes populares, inferiorizadas. Mais tarde, a palavra folclore passou a ser relacionada a toda a cultura nascida principalmente nessas classes, dando ao folclore o status de histórias não escritas de um povo.

 

Mesmo com o avanço da ciência e da tecnologia, anos mais tarde, a influência do pensamento positivista do século XIX contribuiu para dignificar as tradições populares, entendendo-as como um continuum em uma cadeia ininterrupta de saberes que deveria ser apreciada para se entender a sociedade moderna. Houve, portanto, uma conscientização de que a cultura popular poderia desaparecer devido ao novo modo de vida urbano-industrial, seu estudo se espalhou, ao mesmo tempo em que ela passou a ser usada como elemento principal em obras artísticas, despertando o sentimento nacionalista dos povos.

 

Não demorou muito para que os estudos do folclore se estendessem às Américas, nos Estados Unidos, em 1888, William Wells Newell, Mark Twain, Rutherford Hayes e um grupo de outros interessados fundaram a Sociedade Americana de Folclore (do inglês “American Folklore Society”). Essa instituição publica um jornal até hoje, o Journal of American Folklore. A contribuição desses estudiosos estadunidenses ocorreu através de pesquisas apoiadas por universidades, o que definiu novas metodologias e lançou as bases para a fundação do folclorismo como uma nova especialidade científica, ao lado da antropologia.

 

Aqui no Brasil, os primeiros interesses levaram aos primeiros registros escritos de tradições orais, depois se passou a estudar a música, e mais tarde as festas sazonais. Nesse contexto, diversos artistas ligados à elite urbana brasileira passaram a lançar mão de elementos da cultura popular em suas criações destinadas aos círculos ilustrados, como parte de um projeto, estimulado e desenvolvido pelo governo de Dom Pedro II. A ideia era construir uma identidade simbólica nacional que poderia contribuir para a colocação do país entre aqueles considerados ‘civilizados’.

 

Na verdade, a elite nunca foi inteiramente descolada da influência da cultura popular, porém obras como, por exemplo, I-Juca-Pirama, de Gonçalves Dias, e a música de Luciano Gallet e Alexandre Levy deram destaque a temas do folclore brasileiro no contexto das artes cultas. Desde então, o interesse pelo assunto só cresceu, e, em vários campos, artísticos e acadêmicos. Vale destacar que o folclore interpretado pela elite branca urbana acabou sendo adaptado a fim de naturalizar relações sociais de exploração.

 

Com o aumento dos movimentos nacionalistas, novos desdobramentos dos estudos dos saberes populares surgiram, e, com o surgimento do Modernismo, o folclore passou a ser visto como a verdadeira essência (muitas vezes “embranquecida”) da brasilidade. Procurando colocar o folclore em diálogo com as ciências humanas e sociais, que naquela altura nasciam no país, Mário de Andrade, um dos líderes do Modernismo brasileiro, passa a ser considerado um grande pesquisador do folclore nacional.

 

Outros nomes influentes ligados ao movimento modernista que podem ser citados são: os pintores Di Cavalcanti e Tarsila do Amaral e o músico Villa-Lobos. Estes também incorporaram elementos do folclore em suas obras de maneira destacada. Quando Mário dirigiu o Departamento de Cultura do Estado de São Paulo, entre 1935 e 1938, criou a Sociedade de Etnologia e Folclore, abrindo cursos para a formação de pesquisadores, como Lévi-Strauss.

 

Em meados do século XX, foram atraídos para esse movimento Cecília Meireles, Câmara Cascudo, Edison Carneiro, Florestan Fernandes e Gilberto Freyre. Além de estrangeiros como Roger Bastide e Pierre Verger. Nessa altura, o ‘movimento folclorista’ institucionalizou-se com a criação da Comissão Nacional de Folclore (CNF), fundada em 1947 por Renato Almeida, através de recomendação da UNESCO. Naquele ano, o folclore se inseria nas iniciativas em favor da paz mundial.

 

O folclore ganha status de elemento de compreensão entre os povos, já que, ao mesmo tempo, incentivava o respeito pelas diferenças e permitia a construção de identidades diferenciadas. Mais de uma década depois da criação da CNF, em 1958, foi instituída pelo Ministério da Educação a Campanha de Defesa do Folclore Brasileiro. Fato que incentivou debates e pesquisas através de comissões estaduais de folclore, engajando colaboradores do interior. Esse intercâmbio cidade-campo foi importante para que fosse reconhecida a importância e validade da intimidade dos colaboradores do interior com a cultura interiorana, mesmo que não tivesse uma especialização profissional.

 

Os folcloristas passaram a contar, a partir de 1961, com a Revista do Folclore Brasileiro, que se tornou um importante meio de divulgação e discussão do tema. A revista circulou até 1976 totalizando 41 volumes e se tornou uma incentivadora de pesquisas. Porém, apesar de tantas conquistas do folclorismo brasileiro, ainda não possuía a credibilidade que merecia. Ao longo da segunda metade do século XX, algumas polêmicas surgiram, e, aos poucos, o folclorismo foi perdendo espaço sendo afastado do ambiente acadêmico, no qual se consolidava. Alguns professores permaneceram ligados às universidades, porém a disciplina foi sendo direcionada para um subcampo das ciências sociais.

 

Segundo Claudia Marcia Ferreira, Diretora do Centro Nacional de Folclore e Cultura Popular, a situação do folclorismo ficou pior com o golpe militar de 1964, na ocasião, houve a demissão de Edison Carneiro do cargo de diretor da Campanha de Defesa do Folclore Brasileiro, até então, o principal folclorista. A Campanha foi fechada no dia primeiro de abril com um cartaz na porta que dizia: “Fechado por ser um antro de comunistas”. Com isso, encerrava-se todo um ciclo do folclorismo brasileiro iniciado há cem anos.

 

Em 1965, por força de um decreto, passou a ser comemorado em todo o território nacional, o Dia do Folclore. Para muitos pequenos brasileiros, a data só é lembrada no ambiente escolar e só em agosto. Já para a população adulta, de maneira bastante superficial, infelizmente, a ideia comum de “folclore” limita-se a um conjunto de narrativas fantásticas criadas a partir do que se considera “cultura popular do interior”.

 

Renato Almeida, em 1979, se torna o diretor da nova Campanha de Defesa do Folclore Brasileiro, finalmente reaberta e incorporada à Funarte, que se transformou no Instituto Nacional do Folclore. Em 1990, o Instituto passou a ser denominado Coordenação de Folclore e Cultura Popular, hoje chamado Centro Nacional de Folclore e Cultura Popular, vinculado ao Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional.

 

Os esforços do final do século de retomada de um novo ciclo do folclorismo brasileiro ganham força atualmente. Pesquisadoras e pesquisadores negros e indígenas, através de seus estudos e de sua perspectiva, buscam contribuir com o debate apresentando novos olhares para o tema.

 

Infelizmente, segundo muitos desses autores, sem muita reflexão ou senso crítico, chegam às cidades versões desterritorializadas de estórias do campo. Na cidade, tais narrativas passam por um processo de desvalorização e são reduzidas, muitas das vezes, a lendas vazias, descoladas de um sentido simbólico maior. Fato verificado, especialmente, quando se trata das manifestações culturais de populações subalternizadas nas quais os personagens são negros, indígenas ou mulheres.

 

Segundo Clíssio Santana, historiador, “o problema está na construção dessas práticas, que, muitas vezes, se não na maioria delas, é construída de forma estereotipada, racista, homofóbica, misógina e preconceituosa.” Para o autor, repensar essas narrativas é de extrema importância para que possamos utilizar esse enredo de forma positiva, uma vez que as narrativas folclóricas são utilizadas, principalmente, com crianças em idade escolar: “não existe ingenuidade na construção do Saci-Pererê, por exemplo, onde a imagem do ‘negro malandro’ que não é e nem merece ser levado a sério é reforçada”.

 

Assim, como trabalhar para uma real valorização destes saberes tradicionais? Santana nos ajuda a responder a essa questão ao evidenciar, mais uma vez, a personagem do Saci-Pererê, a qual, segundo o autor, “é fruto de uma visão racista, europeizada e preconceituosa sobre o negro e o seu lugar na história do Brasil”. Professores comprometidos com uma educação antirracista, por exemplo, podem trabalhar tal personagem através de suas características clássicas (inteligência, astúcia, criatividade, ludicidade) de modo a valorizá-lo.

 

Lendas e mitos bem conhecidos como Boitatá, Capelobo, Cobra-grande, Corpo-seco, Boto, Cuca, Curupira, Lobisomem, Iara, Mandioca, Mapinguari, Mula sem cabeça, Negrinho do Pastoreio, Vitória Régia, entre outras devem ser valorizadas e respeitadas como outras formas de interpretar o mundo, muitas são para os indígenas, por exemplo, manifestações sagradas de algo que já existiu em algum momento ou que ainda existe.

 

A Constituição do Brasil protege o folclore através dos artigos 215 e 216, que tratam da proteção do patrimônio cultural brasileiro, ou seja, “os bens materiais e imateriais, tomados individualmente ou em conjunto, portadores de referência à identidade, à ação, à memória dos diferentes grupos formadores da sociedade brasileira”. Nós, brasileiros, com a intenção de contribuir com essa proteção, devemos exercitar nossa alteridade frente a essas narrativas, dando espaço para novas formas de ver o mundo.

 

Por Henrique Lage Chaves

Professor

Era Vargas é tema de debates na 3ª série do Ensino Médio

O gaúcho Getúlio Vargas foi presidente do Brasil em duas ocasiões: de 1930 a 1945 e de 1951 a 1954

 

As turmas da 3ª Série do Ensino Médio participaram de um ciclo de debates sobre a Era Vargas (1930–1945), período em que Getúlio Vargas ocupou a Presidência da República. A atividade foi realizada à distância, por meio da plataforma Teams, que é utilizada pelo Colégio dos Jesuítas para aulas e demais encontros virtuais.

 

Segundo o coordenador dos trabalhos, o professor de História Leandro Almeida, os debates aconteceram em cada uma das turmas da 3ª série do Ensino Médio, dos períodos da Manhã e Integral. Cada debate foi dividido em duas partes. Na primeira, os estudantes foram distribuídos em subgrupos de forma aleatória e puderam relacionar diversos pontos de vista sobre Vargas com base em argumentos historiográficos.

 

Depois, com toda a turma reunida, aconteceu o confronto de ideias. “Pude perceber que os estudantes se envolveram muito. Pesquisaram além do que foi disponibilizado e tiveram respeito e tolerância com os colegas, mantendo um alto nível das discussões. Foi uma ótima experiência”, afirma o professor Leandro Almeida.

 

Opinião compartilhada pelas estudantes Giovanna Marinho Duarte, Laura Delgado Lavinas e Maria Eduarda Fraga Gomes, todas da 3ª série do Ensino Médio. No vídeo abaixo, elas falam sobre como os debates ocorreram.

 

 

 

Os debates aconteceram no mês de julho, após o estudo do período varguista. Os estudantes também responderam a questões discursivas e objetivas sobre o tema. Ainda de acordo com o professor de História Leandro Almeida, os jovens fizeram suas próprias pesquisas sobre trabalhos de historiadores e cientistas políticos e sociais, o que contribuiu para o enriquecimento do debate.

 

Getúlio Dornelles Vargas, mais conhecido simplesmente como Getúlio Vargas, nasceu em São Borja (RS) e foi presidente do país em duas ocasiões, de 1930 a 1945 e de 1951 a 1954. Os debates foram focados no primeiro governo, mas foram permitidas citações fundamentadas sobre o segundo mandato.

 

Escritor Fernando Carraro faz visita virtual a estudantes do 5º ano/Fundamental: Momento de reflexão sobre o cuidado com o planeta

 

Uma tarde repleta de aproximação com o universo da pesquisa e de conscientização sobre o cuidado com o meio ambiente. Assim foi a visita virtual do escritor Fernando Carraro aos estudantes do 5º ano/Fundamental, realizada nesta terça-feira (15). O autor respondeu dúvidas de todas as turmas e falou sobre seu livro paradidático “O Planetário”, publicado pela Editora FTD e que vem sendo trabalhado em sala de aula.

 

Formado em História e Geografia e também em Filosofia, Psicologia e Pedagogia na Faculdade Salesiana de Filosofia, Ciências e Letras de Lorena (SP), Fernando Carraro foi professor em escolas da capital paulista e no interior de São Paulo, nas redes pública e privada.

 

Na conversa, o autor falou sobre o seu apreço por ciências como Geografia e Astronomia, suas motivações na hora de escrever, como é o seu processo de trabalho, entre outros assuntos.

 

Foram muitas as perguntas sobre a obra “O Planetário”. Os estudantes queriam saber detalhes da criação de personagens (inspirados em pessoas reais, como os irmãos do autor e um professor da faculdade, o Padre Hugo) e de trechos da obra. Pesquisador e apaixonado pela Astronomia, Carraro fez menção na conversa, ao planetário localizado no Centro de Ciências do campus da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF).

 

Questionado se gostaria de conhecer todos os planetas, o escritor demonstrou não ter essa ambição e ressaltou a importância do cuidado com a grande Casa Comum: “Eu estou contente aqui com a Terra, com esse planeta onde eu moro. Agradeço a Deus de ter feito ele tão bonito para nós, onde tem tudo: água, atmosfera, animais, o que você plantar, nasce. É fantástico! Temos que cuidar”.

 

Ao final da última visita do dia, na turma D do 5º ano/Fundamental, Fernando Carraro agradeceu o convite e deixou um recado aos estudantes: que tivessem paciência para atravessar a pandemia.

 

“Não se sintam chateados: ao menos vocês estão em uma escola, ao menos estão tendo aulas, podem comprar livros. No país em que vocês moram, milhões de crianças não podem. Se considerem crianças privilegiadas, agradeçam a Deus por isso. Vocês estão em uma escola para se formar, mas principalmente, para melhorar um pouquinho esse nosso planeta, essa nossa casa que nós amamos tanto, o planeta mais lindo do universo”, finalizou.

Tiradentes: mito ou herói?

 

 

O dia 21 de abril é feriado no Brasil porque se comemora o Dia de Tiradentes. A data remete ao dia da morte do mineiro Joaquim José da Silva Xavier, o que ocorreu em 21 de abril de 1792. Joaquim José foi um dos líderes da Conjuração Mineira. Era conhecido pelo apelido “Tiradentes” e é considerado por muitos como um “herói nacional”. Mas de onde vem essa ideia do heroísmo de Tiradentes?

 

De todos os participantes da Conjuração Mineira, Tiradentes foi o único executado. Era o participante mais atuante e por ser militar, ou seja, devia obediência à Coroa, a penalidade foi mais cruel. Depois de três anos preso, o alferes, no dia 21 de abril de 1792, foi enforcado, decapitado e esquartejado. Para que os súditos da Coroa nunca se esquecessem da lição, a cabeça de Tiradentes foi encravada numa estaca e exposta em praça pública em Vila Rica, e seus membros, espalhados pela estrada que levava ao Rio de Janeiro.

 

Com o tempo, sobretudo após a Independência, sua imagem passou a ser usada como símbolo de luta pela liberdade no Brasil, tanto na fase imperial quanto na fase republicana. Na fase republicana, essa construção simbólica foi necessária para dar credibilidade à República, já que todo processo de implantação da mesma foi desprovido de qualquer apoio popular, abrindo aí uma lacuna. Para o historiador José Murilo de Carvalho, autor de A Formação das Almas (Rio de Janeiro: Cia. das Letras, 1ª edição, 1990), “para consolidar-se como governo, a República precisava eliminar as arestas, conciliar-se com o passado monarquista, incorporar distintas vertentes do republicanismo. Tiradentes não deveria ser visto como herói republicano radical, mas sim como herói cívico religioso, como mártir, integrador, portador da imagem do povo inteiro”, alguém que fosse um líder, mas de características também submissas, como exemplo ao povo.

 

Sob esse aspecto, Tiradentes pode ser visto como uma das mais importantes figuras que tiveram sua representação manipulada a fim de fortalecer a nossa República. Sendo representado sob a figura de um mártir quase messiânico, Tiradentes é colocado como o formador de um ideal patriota em que a nação se colocava antes da própria vida.

 

Portanto, nos últimos anos, essa ideia de mito vem sendo desconstruída por alguns historiadores. Há um retorno na documentação, valorizando a busca de uma nova leitura, dando ênfase aos aspectos não tratados em fontes anteriores e essas fontes têm muito a nos revelar.

 

Existe um Tiradentes sob várias faces: o mártir símbolo dos republicanos, o sacrificado como Jesus Cristo, o bode expiatório, o líder da Conjuração Mineira, o ignorante. Qual dessas seria a face verdadeira? Especulações à parte, o que importa na história da Inconfidência Mineira é que a imagem de Tiradentes enquanto herói resiste ao tempo. Mas, como a História do Brasil continua sendo escrita, qual a história que será contada, no futuro, sobre o que está ocorrendo no presente?

 

Qual é o verdadeiro Tiradentes? O mártir, símbolo da República? O líder da Conjuração Mineira? O ignorante? Ou aquele que serviu de exemplo para seus companheiros? O que importa na história da Conjuração Mineira é que a imagem de Tiradentes enquanto herói resiste ao tempo. Mas, como a História do Brasil continua sendo escrita, muito ainda há para ser abordado e discutido, e a historiografia brasileira vem se enriquecendo a cada dia com novos trabalhos e novas pesquisas, mas Tiradentes ficou eternizado na história.

 

Por Adriana Malaquias e Marcela Torres

Professoras